Os mascarados virtuais e o fascismo em rede

Concebida para ser o vetor de uma nova forma de organização social, a Sociedade da Informação, a internet se transformou rapidamente numa espécie de manicômio eletrônico em que a loucura e o oportunismo encontram território fértil para prosperar. Em meio a essa fauna, há oportunistas do anonimato que se incumbem (ou são incumbidos) da patrulha ideológica. O que essa gente faz ? Eles têm um papel análogo ao dos terroristas que explodiam bancas de jornais na década de 70. Assustam as pessoas para que elas se afastem de uma determinada linha de pensamento, caiam numa inexorável espiral do silêncio e se anulem como cidadãos desse vasto mundo virtual.

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Não é segredo para ninguém que os partidos, especialmente o PT, mantêm milícias pagas para interferir na maneira como o debate político se processa no ambiente da rede. Essas milícias, patrocinadas muitas vezes por dinheiro do contribuinte, atuam como multiplicadores das mensagens produzidas pela infantaria do jornalismo engajado e também, talvez principalmente, para desqualificar as mensagens produzidas pela infantaria inimiga. O leitor, aquele a quem a Constituição assegura pleno direito de se informar, acaba sendo fustigado pelos franco-atiradores de aluguel quando se identifica com esta ou aquela posição. 

Recebi durante o fim-de-semana um e-mail preocupante. Uma das leitoras mais ativas do blog contava que decidiu encerrar sua conta no Facebook por estar assustada com o assédio coativo dos milicianos da internet. E por que ela virou alvo ? Porque de vez em quando compartilhava textos deste blog no Facebook, com a própria leitora explica:

“Adoro sempre a maneira objetiva e clara como vc escreve as verdades dolorosas. E sempre compartilho tudo que vem de vc no meu Feed de Notícias. Em geral não faço comentários, apenas coisas como “então, né?”, “ói só”. E por aí vai. Na sexta feira eu compartilhei o  “PT INSTRUMENTALIZOU STF. QUAL É A NOVIDADE?”.  Compartilhei sem nenhum comentário. A novidade foi para mim. Um petralha de plantão partiu para a ignorância já começando a ofender a 1ª.pessoa que fez um comentário. Iniciou-se uma discussão e o petralha baixou completamente o nível falando palavrões. Eu tentei interferir pedindo que parasse com aquilo e que ele deveria respeitar a opinião de outras pessoas. Ficou tudo ainda pior. Ele falou tantos palavrões , ofendeu tanto que eu acabei por bloqueá-lo para que não pudesse falar mais nada porque eu já estava morta de vergonha”.

Em uma situação como essa, a arma do internauta é pífia. Tudo o que ele pode fazer se resume a tentar bloquear a pessoa que a ofende e denunciá-la aos administradores da página. No caso dessa leitora, porém, nem isso funcionou. Veja:

“Quando ele percebeu que eu o havia bloqueado começou a enviar msgs inbox. Me ofendeu tanto. Lembrei do livro do Tuma pq ele tentou “assassinar a minha reputação”. Só não me chamou de santa pq o resto foi tudo. Até de psicopata fui chamada. Não tive alternativa senão encerrar minha pagina do FB. Mas eu estou lhe contanto isso para que vc veja que não é apenas a imprensa que eles estão tentando boicotar. É sua opinião pessoal. Vc não pode falar nada contra eles (e que são as verdades) que eles partem para uma agressão tão desproporcional, tão descabida que eu não consigo entender. Me senti atacada por um Black Bloc como se estivesse em uma manifestação”.

Minha leitora, que mais do que justificadamente pede o anonimato para denunciar seu sofrimento, conclui o seguinte:

“Fiquei passando mal desde 6ª. Feira com uma sensação de medo, de pânico. Eles ameaçam, mentem, criam situações, acabam com vc. São capazes de criar verdadeiros dossiês sobre vc . Percebo que estão partindo para a atemorização para que vc fique quieto por medo. Ele disse que deveria me processar. Mas pq? Só pq eu penso diferente deles. Só pq eu penso como vc? O que eles estão tentando fazer  conosco, Fábio? Mesmo assim eu quero continuar postando seus textos.  Pensei em enviar por email para pessoas do meu relacionamento. Se for assim você me envia o link ou eu terei que procurar no Acta diurna?”

Ou seja: para manter esse vínculo de identidade, para continuar compartilhando textos com os quais sente empatia, minha leitora foi compelida a a recorrer a uma espécie de clandestinidade em rede. Quer continua lendo e compartilhando, mas apenas com um grupo de pessoas conhecidas, entre as quais estará imune às agressões que tanto a assustaram. Agora reflita: é ou não uma espécie de metáfora virtual da clandestinidade real que regimes de exceção impõem a quem discorda do pensamento hegemônico ? A mensagem é: não compartilhe textos que contêm pensamentos subversivos; não ouse manifestar sua opinião divergente; cale-se na sua insignificância contra-hegemônica. É isso o que os miliciano da rede querem que você entenda. 

Ainda ontem fiquei sabendo pelo blog do Reinaldo Azevedo que os mujahidin eletrônicos sabotaram a página do filósofo Olavo de Carvalho no Facebook. Trata-se, sem dúvida, de outro ataque da mesma natureza. Nao menospreze a fúria coativa desses vândalos da internet. Eles não estão aí para brincadeira. Além de formarem uma numerosa legião de mercenários, contam com a fúria irracional dos malucos em geral, com quem compõem para transformar blogs e fóruns em ambientes insuportavelmente beligerantes. 

Perigo no ar: 64 pilotos fraudaram habilitações da ANAC

Reportagem exclusiva do repórter Sandro Barboza, do produtor  Tony Chastinet e da editora Roberta Kerpen , da Rede Bandeirantes, chama a atenção para uma investigação que apura fraudes na habilitação de pilotos pela Agência Nacional de Aviação Civil.

Adulterações no sistema informatizado que gerencia o cadastro dos aviadores feitas por um estagiário da agência que agia em conluio com despachantes e pilotos, permitiram que monoglotas na língua portuguesa se transformassem em fluentes falantes de inglês. Um dos candidatos inventou o neologismo “conheciments”. Outro confundiu ‘flap’, que designa uma das superfícies aerodinâmicas da asa, com ‘flat tyre’, pneu furado em português.

Um dos pilotos envolvidos na investigação faleceu em um acidente no fim do ano passado. O avião que ele pilotava colidiu com a Serra do Mar próximo a Paraty, no litoral sul do Rio de Janeiro. O pai dele também perdeu a vida nesse acidente.

 

Papuda, o inferno brasileiro

Delúbio Soares teve suspenso o direito de trabalhar fora da cadeia por decisão da Vara das Execuções Penais do Distrito Federal. O motivo: as mordomias concedidas ao presidiário petista, como carro com chofer estacionado no pátio, comida vinda de fora e visitas a qualquer hora.

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José Dirceu despacha com quem bem entende na sala do diretor do presídio. Foi lá que ele recebeu, sem nenhum problema, agendamento ou autorização prévia, a visita de um defensor público que não tem nenhuma relação com a sua situação judiciária. 

A reportagem do jornal O Globo que revelou essa ‘audiência’ entre o chefe da Defensoria Pública da União e o chefe dos mensaleiros petistas explica assim o que aconteceu: “O defensor conta ter ido ao presídio sem avisar e, ao chegar à Papuda, o réu foi avisado de sua presença. Dirceu concordou em recebê-lo”. Ou seja: compete apenas ao presidiário José Dirceu, o novo chefe da Papuda, “concordar” com a realização de compromissos sociais dentro da cadeia para que eles aconteçam.

Parlamentares usam jalecos da Polícia Civil para entrar clandestinamente no presídio e visitar José Dirceu. O deputado Chico Vigilante usou roupa branca para se confundir com os detentos e ir ter com seu líder. 

Melhor do que isso, nem em em Assassinato de Reputações, do Romeu Tuma Jr. e do Cláudio Tognolli. Quem leu sabe do que estou falando.

Além disso, a multa que a justiça impôs aos condenados foi paga por vaquinhas milionárias. Não é pequeno nem pouco eficiente o esforço dos petistas para desmoralizar o Poder Judiciário e afrontar a sociedade.

O descalabro dos privilégios concedidos aos mensaleiros é tão grande que o governador do Distrito Federal, o petista Agnelo Queiroz, foi chamado às favas pela Vara das Execuções Penais. Vai ter que dizer se pretende manter o tratamento VIP dados aos colegas de partido que se encontram guardados na Papuda ou se os mensaleiros terão que ser transferidos para presídios federais. 

Não há imagem melhor para ilustrar o que ocorre do que a piada do inferno brasileiro, onde todos estariam obrigados a consumir um balde de excrementos por dia — e ainda assim seria a preferida de dez entre dez almas penadas.

Porque um dia falta balde. Noutro falta merda .No terceiro, o diabo não vem.

PT instrumentalizou STF. Qual é a novidade ?

Sobre a agonia no lance final do julgamento do processo do Mensalão pode-se dizer tudo: “tarde triste”, como disse o ministro Joaquim Barbosa, tarde vergonhosa como pensaram muitos, etc etc.  Menos que tenha sido uma tarde surpreendente. Porque o  processo que conduziu ao resultado de ontem — a absolvição do crime de formação de quadrilha dos réus do Mensalão — vinha sendo preparado há muito tempo — e com maestria — pelo governo petista com a instrumentalização paulatina da suprema corte do País. 

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No cerne dessa estratégia esteve a substituição de nomes de julgadores íntegros como os ex-ministros Ayres Britto e Cezar Peluso por outros comprometidos com as lides petistas — caso de Teori Zavascky e Luis Barroso, dois entes estranhos à composição do plenário que iniciou o julgamento da AP-470. Com a chegada de ambos, não apenas a composição política do Pleno do STF, mas sobretudo o perfil doutrinário foi drasticamente alterado para que se chegasse ao resultado a que se chegou na sessão desta triste quinta-feira.

A tática não é estranha aos países do chamado Eixo Bolivariano — Venezuela, Equador, Bolívia, Argentina e agora o Brasil. Foi por meio dela, por exemplo, que o tribunal constitucional de Caracas permitiu o adiamento da posse de Hugo Chavez quando este, moribundo, padecia em Cuba do câncer que terminou por matá-lo. Inventou-se uma norma para aplainar o caminho de Maduro até a presidência da Venezuela.

A decisão, anunciada pela presidente do tribunal constitucional Luisa Estella Morales (uma espécie de Luis Roberto Barroso de saia) contrariou o que está expresso no texto da constituição venezuelana, que manda realizar novas eleições em caso de impedimento permanente do candidato vitorioso nas eleições. 

No Equador, Rafael Correa tem usado o Poder Judiciário para penalizar jornalistas que lhe são críticos. Caso notório foi a condenação a três anos de prisão de três profissionais do jornal El Universo e a aplicação de uma multa estratosférica de US$ 40 milhões pela publicação de um texto que chamava Correa de “assassino de lesa humanidade”. Depois, reconhecendo o exagero da sentença, o próprio Rafael Correa “perdoou” o jornal e os jornalistas.

Na Argentina, um processo muito parecido com o que ocorreu no Brasil permitiu à presidente Cristina Kirshner impor a chamada Ley de Medios, um dos fetiches da esquerda brasileira, que tem por objetivo restringir a liberdade de imprensa e, por conseguinte, amainar as críticas que o governo recebe com hostilidade beligerante.

Não por acaso a América Latina vive hoje um paradoxo claro: a despeito de nunca ter havido um bloco tão expressivo numericamente de países democráticos ,  a democracia ainda incipiente é considerada um bem político de pouco valor — e, por esta razão, frágil. São “democracias de eleitores”, muito distantes ainda de uma “democracia de cidadãos”, na avaliação do Programa da Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

O resultado do julgamento do Mensalão, portanto, foi uma construção tática com o mesmo propósito de movimentos semelhantes ao largo do continente. Teve por objetivo enquadrar o Supremo Tribunal Federal como instrumento da realpolitik e nisso foi muito bem-sucedido. Não houve surpresa.

Afinal, o que estava em discussão não era fazer o que é certo ou o que é justo, consolidar ou aprimorar as instituições democráticas.  Era fazer o que é melhor para uma facção política. — e, com isso, os petistas não brincam.

A vingança dos mensaleiros

Bastou a quadrilha mensaleira baixar o xilindró, em outubro passado, para as coisas começarem a se degenerar no presídio da Papuda, em Brasília. A presença da caterva petista aumentou enormemente a entropia dentro da cadeia, a ponto de ser necessária a intervenção da Vara das Execuções  para fazer amainar o clima de festa partidária.

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Os sinais do que iria acontecer começaram muito antes da ‘internação’ da quadrilha (desculpe aí se ofendo seus amigos, ministro Barroso!). O carcereiro-mór, o governador Agnello Queiroz, mandou construir uma ala nova para receber seus companheiros.

Logo na primeira semana após a consecução das  prisões, mulheres dos outros presos passaram a reclamar dos muitos privilégios concedidos aos meliantes do PT: Visitas em horários e dias inapropriados, filas furadas na cara dura, convescotes sindicais, festas políticas e as muitas tentativas de alguns dos presidiários de engabelar a Justiça, caso notório de José Genoíno e suas crises cardíacas que jamais se confirmaram em sucessivas maratonas hospitalares.

Com a mesma naturalidade com que afrontaram as leis penais e a moralidade pública quando soltos, os petistas passaram a afrontar as regras — inclusive a etiqueta — que regem o sistema penitenciário. José Dirceu chegou a ter suspensa a discussão de  privilégios acertados com um advogado de Brasília visando a uma sinecura em seu escritório por supostamente ter falado por celular com um amigo de dentro da Papuda. E tudo isso depois da pantomima em que se transformou a primeira oferta de trabalho, feita por um hotel que pertencia a um fantasma panamenho (por que será que tudo o que acontece com essa turma é sempre tão torto e complicado ?). A propósito, a quem mesmo esse fantasma representava na sociedade do Hotel Nacional ?

Até a CUT, outrora tão altiva, acabou por reduzir-se ao papel de agência de emprego de bandido ao oferecer trabalho para que Delúbio Soares, o mais encrencado dos comissários petistas, pudesse transpor as ameias da Papuda. Deve ser fácil para uma central sindical que não preza a própria história. Afinal, o dinheiro que vai sustentar essa aberração  sai do bolso do trabalhador para o governo federal, que o repassa então à central.

Dois diretores da Papuda já caíram. Os privilégios aos petistas, que jamais foram contidos, agora ameaçam a estabilidade do próprio sistema. Fala-se abertamente em rebelião. O ministro Marco Aurélio de Mello lembrou que um presídio é um caldeirão. O aumento da entropia provocado pela insolência dos réus do Mensalão ameaça agora a paz social, não apenas as finanças do Estado. 

A rigor, não pode haver surpresa no que está acontecendo. Onde há um mensaleiro, há confusão. Não foi exatamente isso o que aconteceu quando eles chegaram ao Poder ? Foi dali, do alto da presidência, que eles montaram um esquema para conspirar contra a República, subornar parlamentares corruptos e corromper as relações institucionais com o parlamento. O aumento da entropia os persegue onde quer que eles estejam. Pela razão clara e cristalina de que são eles — Zé Dirceu, Delúbio, Genoíno etc — a força motriz por trás da implacável Segunda Lei da Termodinâmica petista.

A despeito disso tudo, o STF dos ministros Barroso e Teori se prepara para aliviar o sofrimento e encurtar a permanência dos criminosos mensaleiros nas malhas do sistema penitenciário, desmoralizando o primeiro julgamento. Todo mundo sabe que os dois meritíssimos juízes — e não só eles — estão ali para isso, e é exatamente isso o que vão fazer: impedir o Estado de punir essa quadrilha pelo crime de formação de quadrilha. 

Isso pode não ser bom para o País, mas vai ser bom para cerca de 5 mil brasileiros: os que não pertencem à facção partidária dos mensaleiros e querem paz para seguir cumprindo suas penas.

Maconha: PV fecha questão pela descriminalização

O Partido Verde (PV) emitiu hoje uma nota anunciando que voltará a defender uma de suas mais antigas (e menos desfraldadas) bandeiras: a descriminalização da maconha. O partido apresentou, por meio do deputado Eurico Jr. (RJ) um projeto de lei que “estabelece medidas para o controle, a plantação, o cultivo, a colheita, a produção, a aquisição, o armazenamento, a comercialização e a distribuição de maconha (cannabis sativa) e seus derivados”.

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Entre outras coisas, a proposta permite o cultivo de até seis plantas em hortas domésticas. A produção anual será limitada em 480 gramas, o que corresponde a um consumo médio mensal de 40 gramas. 

No ano passado, a Câmara dos Deputados aprovou, em primeira votação, um anteprojeto de autoria do deputado Osmar Terra que vai no sentido oposto: recrudesce e alonga as penas de reclusão para traficantes de qualquer porte, prevê a internação involuntária de usuários por determinação de agentes de segurança e não fixa limites objetivos de quantidades de drogas que distinguiriam usuários de fornecedores.

A nota do PV é reproduzida na íntegra no final deste post

A TV entra no debate

Depois de décadas banida do noticiário, a discussão sobre a descriminalização — inclusive para fins recreativos — ocupa agora praticamente todos os telejornais e programas de entrevista. Hoje mesmo a TV Cultura levou ao ar um debate entre os médicos Dartiú Xavier, psiquiatra da UNIFESP,  e seu colega Renato Filev, neurobiólogo do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas da mesma universidade.Ambos são pesquisadores de longa data do assunto e defendem o uso medicinal 

O video com a reprodução do programa pode ser visto aqui embaixo. Vale a pena conhecer os argumentos dos dois especialistas.

Nota do Partido Verde

Depois de décadas de pesquisas, estudos e debates sobre o uso e a legalização da maconha, o Partido Verde apresentou, na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei nº 7187 de 2014, protocolado por Eurico Júnior (PV-RJ), que estabelece medidas para o controle, a plantação, o cultivo, a colheita, a produção, a aquisição, o armazenamento, a comercialização e a distribuição de maconha (cannabis sativa) e seus derivados.

Único partido a apresentar propostas, de forma favorável e clara, em seu programa partidário, para a legalização do consumo da maconha no Brasil, o Partido Verde defende a legalização como uma forma de proteger os habitantes do país contra os riscos decorrentes do vínculo com o comércio ilegal da maconha e com o narcotráfico, buscando, mediante a intervenção do Poder Público, enfrentar as consequências sanitárias, sociais e econômicas do uso de substâncias psicoativas, bem como reduzir a incidência do narcotráfico e do crime organizado. Além disso, o PV entende que o uso da maconha está ligada à liberdade individual.

O Projeto de Lei, protocolado em Brasília, prevê que o Poder Público também deverá ser responsável pela implantação da política de uso da maconha, dando prioridade às medidas voltadas ao controle e à regulação das substâncias psicoativas e de seus derivados, bem como às normas que têm por objetivo educar, conscientizar e proteger a sociedade contra os riscos do uso da maconha para a saúde, particularmente no que tange ao desenvolvimento da dependência, levando-se em conta os padrões da Organização Mundial da Saúde (OMS) concernentes ao consumo dos diferentes tipos de substâncias psicoativas.

A respeito da produção, cultivo e colheita, o PL 7187 deixa claro que a permissão para plantação, cultivo e colheita, em âmbito doméstico, de plantas cannabis de efeito psicoativo, para consumo individual ou compartilhado no recinto do lar, é de até seis plantas. Já o produto da colheita da plantação é fixado em até no máximo de 480 gramas anuais. Os menores de 18 anos de idade e os incapazes não poderão ter acesso à planta para uso recreativo. A violação acarretará responsabilidades penais.

O PL também enfatiza a necessidade de parceria entre o Ministério da Saúde e a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas para promover políticas e mecanismos adequados para a promoção da saúde, a prevenção do uso de cannabis, bem como dispor dos meios de atenção apropriados para o assessoramento, orientação e tratamento dos usuários problemáticos de cannabis que o requeiram. Além disso, o Projeto de Lei sugere que o Ministério da Educação também seja envolvido por meio de políticas educacionais de prevenção do uso, a partir da perspectiva do desenvolvimento de habilidades para a vida.

História da maconha – Originária da África, a planta foi considerada um medicamento valioso no século XIX e nos primeiros 40 anos do século XX. Em livros de medicina brasileiros, ingleses e americanos dessa época, é possível encontrar receitas da planta para uma série de distúrbios. No Brasil, a planta chegou cedo, talvez ainda no século XVI, trazida pelos escravos – o nome “maconha” vem do idioma quimbundo, de Angola. Mas, até o século XIX, era mais usual chamar a erva de fumo-de-angola ou de diamba, nome também quimbundo. 

Antiga, ela está em toda parte. Mas, de longe sem unanimidade. Não há acordo. Uns querem destruir, outros cultivar. Tentam extinguir uma planta e sua cultura. Por séculos, a droga foi tolerada no país. Somente em 1830 o Brasil fez sua primeira lei restringindo a planta. A Câmara Municipal do Rio de Janeiro tornou ilegal a venda e o uso da droga na cidade e determinou que “os contraventores serão multados, a saber: o vendedor em 20 000 réis, e os escravos e demais pessoas, que dele usarem, em três dias de cadeia.” Note que, nessa primeira lei proibicionista, a pena para o uso era mais rigorosa que a do traficante. Há uma razão para isso. Ao contrário do que acontece hoje, o vendedor vinha da classe média branca e o usuário era quase sempre negro e escravo.

Proibição – No início do século XX, a maconha era liberada no Brasil. Fumada nos terreiros de candomblé e nos confins do país por agricultores depois do trabalho. Na Europa, ela era associada aos imigrantes árabes e indianos e aos incômodos intelectuais boêmios. Nos Estados Unidos, quem fumava eram os mexicanos que imigraram a procura de trabalho. Ou seja, no Ocidente, fumar maconha era relegado a classes marginalizadas e visto com antipatia pela classe média branca. Por outro lado, tinha grande importância econômica: remédios, papel, tecidos, cordas, velas de barco, redes de pesca, entre outras funções. As plantações de cânhamo tomavam áreas imensas na Europa e nos Estados Unidos. Com a Lei Seca nos Estados Unidos, a maconha se tornava cada dia mais popular. Com o desenvolvimento de produtos a partir do petróleo: aditivos para combustíveis, plásticos, fibras sintéticas como o náilon e processos químicos para a fabricação de papel feito de madeira, iniciou-se a disputa direta de mercado com o cânhamo.

A proibição tornou-se uma forma de controle internacional por parte dos Estados Unidos, especialmente depois de 1961, quando uma convenção da ONU determinou que as drogas são ruins para a saúde e o bem-estar da humanidade e, portanto, eram necessárias ações coordenadas e universais para reprimir seu uso. Abriu-se então a brecha que os EUA precisavam para intervenções militares e pretexto para entrar em outros países e exercer os seus interesses políticos e econômicos.

Fernando Rodrigues: 57% dos brasileiros apoiam maconha medicinal

A legalização da venda da maconha para fins medicinais, com a apresentação de uma receita médica, é defendida por 57% dos brasileiros, segundo levantamento da empresa Expertise.

Iniciativas mais radicais, como a legalização para uso recreativo, adotada pelo Uruguai, não têm apoio dos brasileiros. Segundo a pesquisa, apenas 19% dos entrevistados são favoráveis à liberação total da erva.

An Initiative To Legalize Marijuana In California To Appear On Nov. Ballot

A maconha deve continuar totalmente proibida para 37% dos entrevistados e 6% não têm opinião formada sobre o tema. Foram realizadas 1.259 entrevistas online nos dias 24 a 27.jan.2014 e a margem de erro é de 2,8 pontos percentuais. Os entrevistados são selecionados a partir de uma base de dados da empresa com informações sobre endereço, idade e sexo e convidados a responder o questionário por e-mail, em troca de prêmios.

O apoio à venda da Cannabis sativa apenas para fins medicinais está em sintonia com a experiência de 21 Estados norte-americanos que regulamentaram o comércio da substância nessas condições. Médicos afirmam que a erva pode aliviar sintomasde diversas doenças, como AIDS, câncer e esclerose múltipla.

O temor popular de que experimentar a maconha uma vez condena o usuário ao vício não se confirma, segundo a pesquisa. Entre os entrevistados, 26% disseram ter usado a erva pelo menos uma vez na vida, dos quais 83% não a fumam mais atualmente. Apenas 4% dos que já fumaram um baseado –ou 1% da população total– disseram fazer uso diário da droga.

Em 2013, a Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) divulgou um estudo com resultados distintos dos apresentados pela Expertise. Segundo essa pesquisa, feita presencialmente com 4.607 indivíduos, 7% dos brasileiros afirmaram já ter usado maconha. O estudo da Unifesp também aponta que 75% dos brasileiros eram contrários à legalização da maconha, mas o questionário não diferenciava o uso medicinal do recreativo.

Há 2 semanas, o Senado começou a discutir uma proposta que legaliza o consumo da maconha para todas as finalidades. A iniciativa partiu de um gestor da área da saúde, que publicou o texto no site do Senado e obteve apoio de 20 mil pessoas. O senador Cristovam Buarque (PDT-DF), relator da proposta, disse não ter “simpatia” nem “preconceito” a respeito da legalização, mas afirma que o Congresso não pode se negar a discutir o tema.

Percepções

Os brasileiros que já experimentaram a maconha são mais otimistas em relação aos seus efeitos sobre a saúde do que os que nunca fumaram. Há um fosso entre as percepções dos 2 grupos, segundo a pesquisa da Expertise.

A droga é “muito prejudicial, com total chance de vício” na opinião de 85% dos que nunca fumaram maconha. Entre os que já usaram a droga, essa taxa cai para 15%.

Entre os que nunca experimentaram a erva, 83% apoiam a sua criminalização total. No grupo dos que já fumaram um baseado, apenas 17% defendem que seu uso continue proibido.

Considerando os brasileiros que não usaram a erva, 40% a consideram menos prejudicial do que o álcool. Entre os que já a experimentaram, a taxa é de 60%.

Os resultados da pesquisa da Expertise não devem ser entendidos como uma guinada liberal do brasileiro em relação a todas as drogas. Segundo pesquisa Datafolha de 2013 sobre o perfil ideológico da população, 83% avaliam que o uso de drogas deve ser proibido, pois “prejudica toda a sociedade”.

O levantamento da Expertise, contudo, identifica uma maior abertura ao debate sobre a legalização da maconha para uso medicinal.

O blog do Fernando Rodrigues está no Twitter e no Facebook.

Preto, pobre e presidiário: o Joseph K. da pós-modernidade

Noite do último dia 10, bairro de engenho de Dentro, Zona Norte do Rio de Janeiro. Um homem de pele preta e cabelo black power,  vestido apenas com uma bermuda, se aproxima de um ponto de ônibus e ataca sorrateiramente  uma senhora indefesa, roubando-lhe a bolsa,  dez reais em dinheiro e um bilhete único.

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Um investigador da Polícia Civil tenta ajudar a vítima, a copeira Dalva da Costa. Ambos saem pelas ruas das imediações à procura do assaltante. Não demora e um homem é identificado como autor do furto. Ninguém repara que ele veste calça e camisa preta, e não uma bermuda. Vem a polícia e o suspeito acaba preso.

Na delegacia, descobre-se que o suposto assaltante se chama Vinícius Romão de Souza, tem 27  anos. Ele diz que é psicólogo e afirma que trabalha em novelas da Rede Globo, mas ninguém lhe dá atenção. Nega com veemência que tenha cometido o crime, mas novamente ninguém lhe dá atenção.

A vítima titubeia: não tem mais certeza de que aquele é o homem que levou sua bolsa. No dia seguinte, pensa em voltar ao distrito policial para desfazer o equívoco. Mas, sem dinheiro para a condução, Dona Dalva decide aplacar sua culpa em casa mesmo. O episódio não chega a lhe provocar nenhum remorso.

Do nada, mensagens de apoio ao suposto ladrão começam a pipocar nas redes sociais. Trancafiado no presídio de São Gonçalo, o suspeito vê dez dias se passarem antes que o ‘mal entendido’ seja desfeito. Pobre do País em que um homem inocente demora dez dias para deixar o cárcere!

A prisão do ator global desvela uma vez mais a influência do vetor racial na consumação de prisões. O Brasil, como estão a demonstrar todas as estatísticas sobre a população carcerária, ainda é um País que põe na cadeia quase que exlusivamente pretos, pobres e putas. 

No Rio de Janeiro, onde os não-brancos representam 41,3% da população, 80,9% da população carcerária são negros ou pardos, segundo a última PNAD do IBGE. Ou seja: há duas vezes mais negros entre os presidiários do que na população em geral. A maior parte dos detentos foi apenada por traficar pequenas quantidades de drogas. Quase 70 %, ao entrarem no sistema prisional, não tinham condenação anterior, eram réus primários. E só 1,8% —  menos de dois em cada 100 — tinham relação com o crime organizado.

Só esses dados já seriam suficientes para demonstrar que a cor da pele funciona como um elemento indiciário para os que não são brancos nem têm olhos claros. Mas eles não bastam para dimensionar histórica e politicamente esse fenômeno de segregação. E, acredite, algumas das causas estão entranhadas no bojo da nossa legislação penal até os dias de hoje.

Tome-se como exemplo a Lei 11.343/2006, que estabelece a política nacional para as drogas. O Artigo 28, no capítulo que trata da penas para o crime de tráfico, prescreve o seguinte: 

Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.

O que vêm a ser “circunstâncias sociais e pessoais” senão a descrição étnica e a situação econômica do suspeito de traficar drogas ?

“É o apartheid dentro da nossa legislação”, diz o senador Antônio Carlos Valladares, (PSB/SE). Ele é o relator do PLC 37/2013 na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Esse projeto, de autoria do deputado Osmar Terra,  já foi votado e aprovado pela Câmara antes de chegar às mãos do senador senador sergipano. Deve ser discutido pela CCJ ainda este semestre.

Como está, o projeto representa um recrudescimento da política repressiva para as drogas. A proposta caminha na direção oposta à das medidas liberalizantes que varrem o planeta. O novo relator critica:  “Precisamos banir essas duas palavras do texto porque elas servem como uma faca no pescoço de legiões de jovens negros e pobres”, diz Valladares.

Já não era sem tempo. Em relação ao comércio de drogas, o crime que mais leva gente para dentro do sistema penitenciário nos dias de hoje no Brasil, a discriminação racial está presente na legislação desde a Independência. A primeira lei coibindo o consumo e a venda de maconha data de 1830. É um decreto da Câmara de Veradores do Rio de Janeiro que emendou o código de posturas da cidade. A norma ficou conhecida como Lei do Pito de Pango e estabelecia o seguinte: 

“É proibida a venda e o uso do pito do pango, bem como a conservação dele em casas públicas. Os contraventores serão multados, a saber: o vendedor em 20$000, e os escravos e mais pessoas, que dele usarem, em três dias de cadeia.”

Ou seja: consumidores negros (escravos) pagam a contravenção com a liberdade; os comerciantes, brancos, recolhem uma multa de vinte mil réis, ridícula para os padrões da época.

Por isso tudo, o episódio envolvendo o ator Vinícius Romão de Souza é muito mais grave do que aparenta ser. Vítima de uma situação em que qualquer preto preso é melhor do que nenhum preso, ele foi vítima antes do racismo. E depois, de um equívoco que jamais teria acontecido se ele fosse loiro ou tivesse a pele clara.

Ainda assim, pode-se inferir que a gravidade poderia ter sido muito maior. Todos os dias, ‘suspeitos’ como Vinícius são detidos injustamente, apanham da polícia e, quando têm sorte,  são amarrados a postes ou levados para o calabouço. Lá, misturam-se com a multidão e purgam penas longuíssimas para quem não fez nada, ou fez muito pouco.

Quando dão azar, são executados na via pública por policiais que dizem ter ‘trocado tiros com o tráfico’ ou por milicianos mascarados que assomam na periferia das metrópoles. Isso poderia ter acontecido a Vinícius, assim como acontece a dezenas de jovens negros todos os dias no País. Felizmente não aconteceu.

O sofrimento moral do ator da Globo, no entanto, não pode ser desperdiçado apenas com uma comoção passageira e vazia. Passou da hora de revermos a legislação para amputar dela dispositivos discricionários que ainda estão em vigor. Há muito o que fazer também em relação ao comportamento do policial. A conduta na rua não deve lhe facultar o direito a uma certa subjetividade na escolha de quem será trata do como suspeito, quem não será molestado, a partir da cor da pele.

Ou o Brasil ataca o problema e trata de encará-lo com a devida seriedade, ou estaremos sempre sujeitos a um surto de indignação por ‘erros’ se repetem todo santo dia na rotina dos distritos policiais, onde desfilam Joseph K’s de pele preta cujo único crime foi o de terem chegado ao mundo como descendentes de escravos africanos.