Herança maldita: a quem compete administrar

Você já ouvir falar no Conde D’Abranhos ? É o personagem central do livro homônimo de Eça de Queirós. Um político carreirista e sem personalidade, que vai do governo à oposição desde que isso lhe traga vantagens pessoais.

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O Conde é um português que viveu ao tempo das guerras napoleônicas. Filho de uma família pobre do interior, renega os pais e vai para Lisboa a fim de fazer carreira. Casa-se com a filha de um desembargador rico e poderoso e acaba, por obra de uma engenharia tipicamente luso-brasileira (os vícios, ah os vícios!..), se transformando num medíocre ministro de Estado.

Nada que o governo Dilma Rousseff não supere a cada reforma ministerial. O governo brasileiro está cheio de Condes D’Abranhos — gente que não tem ideia do que faz, não sabe nada dos assuntos da pasta que governa nem tem familiaridade com o Bem Comum ou o sagrado Interesse Público (repare que eu grafei com maiúsculas).

O Conde de Eça de Queirós se tornou famoso por não conhecer os contornos geográficos do Império português ainda um ano e meio depois de empossado Ministro da Marinha. Foi aí, 18 meses depois de se tornar ministro, que ele descobriu em que mar ficava o Timor. Mas era Portugal, e não havia sido inventado ainda o Google…

Certa vez, ao discursar na tribuna, afirmou, e foi prontamente contestado por colegas da oposição, que Moçambique ficava na Costa Ocidental do continente africano. Ao perceber o vexame, saiu-se com a seguinte resposta:

– Que fique na costa ocidental ou na costa oriental, nada tira a que seja verdadeira a doutrina que estabeleço. Os regulamentos não mudam com as latitudes!

Eduardo Braga, ministro dos apagões petistas, deve ser uma reencarnação tardia do Conde D’Abranhos. Não é crível que uma autoridade do porte dele fale publicamente as besteiras quase impublicáveis que tem dito sobre a crise energética. Não por acaso, essa verdadeira Magda de terno e gravata toma um esporro por dia da colérica Dilma Rousseff, que também, convenhamos, não é nenhum gênio.

Aldo Rebelo, que veio do esporte para a pasta da “inovação”, tem um projeto de lei — devidamente destinado ao arquivo — contra o uso da tecnologia. Pode isso ? Pois acredite, é verdade. É o PL 4502, de 1994 (clique aqui para ver). Na ementa está escrito: “Proíbe a adoção, pelos órgãos públicos, de inovação tecnológica poupadora de mão-de-obra”.

Aldo é um caso de reincidência reacionária renitente. Ele já tentou misturar fécula de mandioca à farinha de trigo (antes da onda glúten-free), proibir catracas eletrônicas em ônibus urbanos e é o responsável por não termos postos de gasolina self-service, como é no mundo todo. O título da pasta que ele ocupa é Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Boa escolha, Presidenta. Um apóstata da tecnologia para cuidar da inovação.

É com este arsenal humano que a Presidenta (eu costumo grafar essa palavra com letra maiúscula porque, como ela formalmente não existe, e por designar algo único no planeta,  deve ser tratada como um substantivo próprio) arregimentou para debelar as crises que ela mesma  provocou no mandato anterior .

Sorte têm os ilustres senhores citados neste post de eu não ter optado por Machado de Assis para construir minhas ilustrações literárias. Em vez do Conde D’Abranhos, eu poderia ter me valido de Simão Bacamarte, o Alienista, e comparado o Palácio do Planalto com a Casa Verde de Itaguaí.

Talvez fosse até mais adequado.

Mas isso fica para uma outra oportunidade.