A cúpula do PT encomendou uma pesquisa para saber a razão da rejeição à legenda, especialmente no estado de São Paulo. Os dirigentes da agremiação não conseguem entender por que a população mais escolarizada, melhor posicionada no espectro social e mais bem-informada do País rejeita o partido — que, aliás, nasceu em São Paulo, no ABC dos anos 80, embalado pela nata da intelectualidade brasileira.
Não era preciso gastar dinheiro com rodadas intermináveis de qualis e pesquisas quantitativas. Os paulistas rejeitam o PT justamente porque têm melhor capacidade de entender a realidade que os cerca e estão mais bem informados do que o eleitor dos grotões. Nesse ambiente, a rejeição ao petismo pode ser entendida como um fenômeno análogo ao da rejeição ao malufismo.
Nos anos 80, quando o PT estava na manjedoura, chamar alguém de malufista era o mesmo que chamar de ladrão. Lembro-me de uma passagem que eu mesmo protagonizei no início da minha atuação como repórter. O então presidente Figueiredo vinha a São Paulo toda quinta-feira para tratar a coluna vertebral com um japonês que se estabelecera no bairro do Paraíso, o ‘Doutor Nishimura’ que, ao que me recordo, não era médico nem nada. E esculhambou com a lordose presidencial.
Formava-se um corredor polonês de repórteres e cinegrafistas em frente à clínica e, sempre que Figueiredo entrava ou saía, lançávamos perguntas ao vento para ver se ele respondia ou não. Eu, ainda um moleque, aos 20 anos de idade, era bem atrevido. Perguntei-lhe porque ele não gostava de ser qualificado como malufista. Foi pura provocação.
Figueiredo deu uma resposta atravessada: “Você fala de adjetivo, eu vou te falar de um verbo. Verbo regular chatear. Tem repórter que chateia, chateia, chateia…”, vociferou, enquanto seguia para as mãos destroçadoras de colunas vertebrais do japonês do bairro do Paraíso.
Era antevéspera da eleição pelo colégio eleitoral. Maluf tinha dificuldade em consolidar sua candidatura no PDS justamente por causa de seu péssimo conceito. Assim como os petistas de hoje, sua volúpia pelo dinheiro público terminou por estigmatizá-lo. Ninguém queria aparecer na foto com Maluf, situação que iria mudar só três décadas depois, quando os petistas passaram a cortejar o velho político paulistano a cada pleito.
Malufismo e petismo têm muito a ver um com o outro. Além de caminharem juntos pleito após pleito, não dão sorte com a justiça. O PT, com a brasileira; Maluf, com a estrangeira. Ambos têm ódio da imprensa e da Polícia Federal. E também é preciso dizer que, em relação à estratégia de dissimulação de sua atividade criminosa, Maluf foi bem mais competente do que o PT. Tanto que até hoje zomba do Judiciário, que ainda não conseguiu trancafiá-lo numa penitenciária, como ocorreu com a cúpula do Partido dos Trabalhadores.
Se há algo que pode diferenciá-los é a escala. Perto do que fez o PT, as tungas de Maluf parecem coisa de trombadinha. Não há comparação possível entre o que foi furtado pelo malufismo e o butim amealhado pelos esquemas cleptomaníacos dos petistas. Aí estão o Mensalão e o Petrolão para prová-lo.
E há uma última dessemelhança importante. O malufismo se circunscrevia a um homem com objetivos imediatos.
A despeito do messianismo de seu líder máximo, o petismo não tem caráter pessoal; é movido por um grupo coeso que tem como perspectiva a eternidade.